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CORONAVÍRUS: E as crianças?
Publicada em 02/07/2020

Por Fernanda Dubourg*


“Eu estou preocupado com a persistência de um stress crônico nas crianças”. A citação do psiquiatra infantil francês, Richard Delorme, chefe de psiquiatria infantil do hospital RobertDebré e coordenador do Centro de Excelência em Distúrbios do Desenvolvimento Neurológico (InovAND), chama a atenção para a assistência às crianças durante a pandemia provocada pelo novo coronavírus. Segundo Delorme, as crianças são as grandes esquecidas da crise sanitária causada pela COVID-19. Essa declaração reforça a angústia de muitos pediatras no Brasil: E as crianças?

Ouvimos falar pouco sobre como elas estão nos veículos de informação após a suspensão das aulas e propagação da informação de que deveriam ser retiradas do convívio social pelo risco de propagação do novo coronavírus.

Desde o início da pandemia a hipótese de que as crianças seriam grandes transmissoras do novo coronavírus, baseada em outros vírus, como a gripe, por exemplo, levou ao fechamento das escolas com o objetivo de quebrar as cadeias de transmissão. As crianças foram separadas dos avós, grupo de risco conhecido, e dos amigos. Com o avanço no conhecimento da COVID-19 e a confirmação de que as crianças desenvolvem poucos ou nenhuma sintoma, o vice-presidente da Sociedade Francesa de Pediatria, o professor Robert Cohen, especialista em doenças infecciosas pediátricas, declarou: "A porcentagem de amostras positivas de crianças, atendidas na sala de emergência ou hospitalizadas, é de três a cinco vezes menor do que em adultos. Portanto, pareceu-nos importante avaliar a porcentagem, de portadores do vírus, em uma determinada região, em um determinado estágio epidêmico".

E por que as crianças são menos contaminadas que os adultos?

Os cientistas se interessaram por um garoto francês de nove anos, dentre outros, que havia sido contaminado com Sars cov-2 (o coronavírus que causa a Covid-19), mas ele não contaminou ninguém entre os 172 indivíduos com quem ele teve contato. Realizando testes em crianças e adultos que visitaram a sala de emergência ou foram hospitalizados, no final de fevereiro e início de março, os médicos descobriram que, na maioria das vezes, os testes eram de três a cinco vezes menos positivo em crianças do que em adultos. Percebeu-se que as crianças infectadas tinham um adulto contaminado ao seu redor, o que é menos o caso na outra direção. Considerando que, para a gripe, as crianças são grandes transmissoras do vírus.

Entre as hipóteses apresentadas:

• É possível que a resposta imune das crianças seja diferente, porque elas geralmente são mais expostas a infecções virais, o que lhes permitiria se defender melhor contra um novo vírus.

• A vacinação muito regular (contra outras doenças) também pode protegê-los melhor, estimulando o sistema imunológico.

No entanto os cientistas permanecem divididos nessas diferentes hipóteses, e outros fatores podem estar envolvidos nessa relativa proteção dos mais jovens. O Pr Robert Cohen realizou um estudo com 600 crianças com a Covid-19 na região Parisiana e adicionou duas hipóteses possíveis, novamente com cautela: "Para essas duas hipóteses, eu acrescentaria uma terceira: as crianças não têm os mesmos receptores nas células que os adultos - se eles têm menos ou mais ou são diferentes ... e o vírus teria menos capturas. Além disso, se forem menos transmissores, pode haver uma razão física: ao tossir e falar, as crianças, sendo menores, emitem menos partículas. Mas ainda estamos nas hipóteses”.

O Pr Cohen conclui: "Se no início acreditava-se que as crianças eram potencialmente perigosas para a transmissão do vírus, é que pensávamos no que sabíamos: a gripe respiratória. A ciência é feita em viver agora. Então, depois do fato, pensamos nisso." Em publicação no Jornal Le Monde, ele declarou que os testes sorológicos mostraram 10% de crianças com coronavírus na região parisiense (Île-de France), uma das mais acometidas. No entanto, apenas 1,8% tiveram PCR positivo nas testagens durante o confinamento e, olhando esses números ainda mais de perto, foi uma surpresa ver que apenas 0,6% eram contagiosos. Além disso, de cada 9 casos em 10, são os adultos doentes que contaminam as crianças e não o inverso, mesmo quando elas têm irmãos e irmãs.

As declarações dos colegas franceses, que vivenciaram o pico de infecção pelo novo coronavírus antes do nosso país, com medidas de confinamento total (lock down), e que atualmente experimentam o retorno das atividades e as consequências comportamentais do isolamento social, nos faz refletir sobre acertos e erros para definir as medidas que devemos tomar para proteger as crianças e assegurar o previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Então, devemos nos perguntar: E no Brasil? Qual a nossa realidade? Qual o risco de adoecimento físico, e também mental, durante a pandemia da COVID-19? Como estão as crianças há 3 meses privadas do convívio de seus pares, de parentes, e até mesmo dos seus pais? Como retomar as aulas com segurança? Como refletir sobre a determinação do “novo normal” sem as colocar em um risco real?

No ambulatório de neurologia pediátrica já pode ser observado aumento de tiques, ansiedade e distúrbios de sono em crianças previamente hígidas, bem como piora do comportamento em crianças com doenças neuropsiquiátricas prévias, por vezes com necessidade de prescrição de medicamentos ou aumento de doses, em decorrência do confinamento. Estudos em outros países também apontam aumento significativo de distúrbios ansiosos, alimentares, depressivos, automutilação além de maus-tratos e acidentes domésticos.

O departamento científico da Sociedade Brasileira de Pediatria publicou documentos de grande relevância com informações e orientações para prevenção, diagnóstico e tratamento da COVID19, reafirmando o compromisso do cuidado com as crianças e adolescentes, e suas famílias.

Precisamos agora analisar os dados da COVID-19 no Brasil no grupo pediátrico e definir o risco para saúde das crianças a pequeno, médio e longo prazo. Assim poderemos definir estratégias que protejam as crianças não apenas da infecção pelo Sars cov-2, mas também dos efeitos deletérios do isolamento social, do uso excessivo de telas, da privação crônica de sono, da suspensão das atividades escolares e de terapias multidisciplinares, e da interrupção das consultas de puericultura, estas importantes na detecção de alterações no crescimento e desenvolvimento e diagnóstico de doenças graves, que não devem ser retardados. Se faz indispensável a participação dos pediatras para orientação das medidas de proteção das crianças no que tange o retorno às aulas e ao convívio social, preservando sua saúde física e mental.


*Fernanda Dubourg – Neuropediatra – Cremeb n° 17070 / RQE n° 17362

 
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